terça-feira, 17 de novembro de 2015

Relendo O Drible

(spoilers, inevitavelmente)

Vale dizer em primeiro lugar (me repetindo de outros posts) que eu nunca acreditei naquela história de que estava faltando na literatura brasileira o Grande Romance sobre o Futebol. Onde estaria o grande romance francês sobre o ciclismo, o grande romance australiano sobre o rugby, o grande romance russo sobre o hockey (logo eles que deram tanta importância ao esporte durante a guerra fria), ou o grande romance americano sobre o baseball?

(Curiosamente, existe um livro chamado The Great American novel, do Philip Roth, que é justamente sobre baseball, mas ninguém o coloca entre suas melhores obras. Alexandre Soares Silva fez o lembrete uns tempos atrás que o Delillo também tem um romance sobre esporte, End zone, mas igualmente é um livro praticamente esquecido )

Por que seria a literatura brasileira, tão mais fraquinha do que a russa, a americana, ou a francesa a primeira a preencher essa lacuna sobre grande narrativa sobre esporte? Sequer existem tantos filmes de esportes que tenham grande apelo para além dos entusiastas daquela atividade; creio que a única exceção seja o boxe (Rocky, Million Dollar baby, etc), que conta com sua brutalidade inerente como grande vantagem para seu lado: nada como um pouco de violência para colocar um pouco de sentido e emoção nas coisas.

Argumenta-se que no nosso caso o futebol não é apenas o esporte favorito do país, que a relação do Brasil com ele é mais profunda do que a de outros países, que estrangeiros ficam chocados pela forma como é da expectativa de todos que não exista expediente de nada não-emergencial durante as partidas da seleção, e que essa profundidade maior seria o suficiente para propiciar a produção dessa narrativa Que Desse Conta da Experiência Nacional.

Um dos problemas estruturais na questão é o tanto que o esporte constrói por si só sua narrativa completa e perfeita, com protagonista e antagonista (invertendo de acordo com o time escolhido), disputas, momentos dramáticos, vitórias e derrotas quase sempre inequívocas, enquanto na literatura moderna é a equivocidade ou a incerteza que frequentemente fundamenta o poder estético. O motor principal da produção de sentido no esporte tende a ser não a confluência de fatores complexos como acontece em um bom romance, e sim a demonstração de poderio físico (seja força, agilidade, o que seja), ou união perfeita de muitos indivíduos em coreografia perfeita, improvisada. O próprio Sérgio Rodrigues comenta isso em um post de seu blog: que romance se safaria do sentimentalismo barato de um Pelé moleque ao ver as lágrimas do pai com a derrota brasileira de 1950 prometendo que ganharia a copa para o país e indo lá oito anos depois e ganhando? Coisa de email motivacional que tias mandam pra todo mundo sem saber que só serve pra deixar mais deprimido quem tá precisando.

Minha aposta, portanto, era de que esse romance nunca viria a existir. Talvez fosse uma aposta ranzinza, já que eu nem sou tão fã de futebol assim (acompanho esporadicamente as partidas dos times nacionais, pois como resistir o jogo imaginário de nações inteiras brigando entre si), e também gosto de ser meio do contra, falando que a literatura não funciona por preenchimento de lacunas pré-imaginadas, que nenhum bom romance é realmente sobre uma coisa só. Eu estava errado, ou pelo menos parcialmente errado, pois é sem dúvida nenhum disparate dizer que o romance do Sérgio Rodrigues é o grande romance brasileiro sobre o futebol. Não li todos, ou até arriscaria a estimativa que não li nenhuma obra ficcional que fale mesmo de futebol que não os ocasionais textos do Sérgio Sant’Anna que abordam o esporte, mas quem sabe não é uma aposta desvairada dizer algo que pudesse minimamente competir com esse romance teria recebido algum destaque nessa comunidade de leitores ansiosa para poder preencher esse vazio tão claramente definido.

Mas eu acho que O Drible é bem mais do que isso, e é exatamente com essa motivação que fui reler o livro e escrevo agora esse post.

Pra quem não sabe, meu mestrado (foi mal) acabou por tratar a literatura brasileira numa abordagem meio megalomaníaca, que tomava o Formação, do Cândido, falando de Arcadismo e Romantismo, emendando com o Literatura como Missão, do Sevcenko (deusotenha), pra falar da virada do século (realismo e “pré-modernismo”) e o Lafetá e Bueno e outros textos soltos pra falar do Modernismo, para construir um panorama da literatura brasileira desde seu início, pegando a questão do “empenho” colocada pelo Cândido como central. É uma dissertação longa, e o resumo apressado dela é também longo [link: http://etudeslusophonesparis4.blogspot.com.br/2014/06/auge-e-derrocada-do-empenho-literario.html ], mas o resumo do resumo do negócio é: se tende a ser normal o escritor falar sobre seu mundo circundante, e no mundo circundante meio porcaria que é o Brasil (pelos milhares de problemas que sempre tivemos em nos organizarmos com um mínimo de competência ao tentar constituir uma sociedade decente, cidadã) o escritor brasileiro de várias épocas diferentes se viu repetidas vezes no papel de denunciador de mazelas e intérprete completo da realidade nacional.

O objeto da dissertação era a literatura do período da ditadura militar, e eu defendo que em nenhum outro momento a questão do engajamento do intelectual foi tão forte. Se antes era possível uma discussão demorada e meio inútil a respeito de qual seria o problema mais urgente do país, depois da queda de Goulart e o estabelecimento de um regime violento e autoritário e radicalmente ilegítimo foi rapidamente estabelecido um consenso que abarcava quase todos os intelectuais: a ditadura precisava acabar se o país era para sair desse buraco eterno.

(já já chego no drible)

Acabou a ditadura, e o país parecia mais afundado do que nunca no buraco. As decepções em sequência da redemocratização (nas palavras do romance, “...desilusão que logo ia se revelar a fibra mais resistente do tecido democrático”) tiravam o brio de qualquer crítico acostumado a ter como oposição a opressão desabrida, a vilania declarada de um governo absurdamente imposto (e não a vilania democraticamente legitimada). O intelectual estava acostumado a tacar pedra (geralmente em voz baixa, por medo de aparecer depois só na lista de sumidos) se viu obrigado a tecer críticas mais complexas do que “torturar é errado” e “democracia é o caminho”, e, claro, talvez mais que tudo, lidar com o desgosto cotidiano que é viver sob os frutos eleitorais da tal democracia de um eleitorado monstruosamente desinformado.

Não havia como essa decepção não ser sentida no campo literário. Os romances-denúncia (dos estúpidos aos brilhantes) não tinham mais seu assunto principal, de pertinência garantida, e mesmo em meio a tantas obras intelectuais contrárias à ditadura o fim do autoritarismo, a passagem de poder ao mundo civil, se deu de maneira tão distante quanto a transferência de chapéu de maioral entre generais, ignorando os anseios demoradamente destilados pelos intelectuais durante as décadas de semi-mordaça. O poder de volta com os civis, continuaria a desigualdade e a miséria que a princípio dependiam encarniçadamente da ausência da democracia para se manter: se o sistema prejudica a maioria, como que a maioria tendo alguma voz institucionalizada, pelo voto, optaria por manter o sistema? Pensar tanto tempo a respeito do país quando as decisões todas são tomadas partindo principalmente na disputa de interesses e não de interpretações? Qual contribuição um refinado intérprete nacional pode trazer para uma partilha de propina? O que Eduardo Cunha vai querer saber de Iracema versus Macunaíma, tirando talvez a disponibilidade dos respectivos domínios de internet?

Os romances brasileiros das últimas décadas, em sua maioria, abandonaram o tema nacional. Abordam, inevitavelmente, a experiência de existir no Brasil, como qualquer obra literária vai fazer (até mesmo uma obra passada em Marte há de ser lida levando em consideração a origem do autor), mas não há mais a ambição de tratar do país. Obras contemporâneas engajadas, como Habitante Irreal, de Paulo Scott, tendem a selecionar questões específicas em vez de se pretender qualquer como entendimento (e “solução”) universal, capaz de dar conta do todo brasileiro. Não coloco isso como necessariamente um defeito, não acho que o romancista brasileiro necessariamente perde ao tirar Raízes do Brasil do seu top 5 de textos balizadores de sua produção para colocar, sei lá, Beckett ou Barthelme ou o que valha. No final da última página o que vale é a qualidade da construção do texto e do entendimento de mundo, seja orientado com fronteiras geopolíticas/culturais em mente ou não.

O Drible é exceção (aeee, chegou, com atraso mas chegou). O Drible é um romance nacional, no sentido de ter a Nação como uma de suas questões principais, sem nem descambar para o constrangimento de comparar a paixão pelo esporte no Brasil com a existente em outros países. Toma o país para discussão com uma mistura incrível de fascínio e desprezo, interpreta várias décadas da nossa história com contundência surpreendente em um número até magro de páginas. Um romance de amplitude condensada, uma concisão forte e natural, sem o quê maníaco dos minimalistas. E, ponto importante, é um canto conscientemente composto para garganta rouca, salvando-se da armadilha da nostalgia: o romance nacional impressionantemente ressuscitado pelo cientista que desafia a natureza, maluco porém ciente que sua criatura só vive enquanto durar a tempestade por ele conjurada.

Não coloco isso aqui como grande achado interpretativo meu; qualquer leitor que não tenha pulado por algum exercício bizarro várias páginas do livro vai se deparar com as várias cenas de Murilo Filho descrevendo sua interpretação sobre o país, a forma como a transmissão radiofônica do esporte conseguiu construir uma união no país por meio do time em disputa, a importância da limitação da mídia para o narrador em fala rápida suprisse com superlativos qualquer realidade manquejante que presenciasse naquele momento:

“Logo discorria sobre o papel desempenhado pela conjugação de futebol com rádio na história do Brasil, tal mágica tendo consistido, segundo sua teoria, na fabricação das toneladas de argamassa necessárias para colar os cacos de um país gigantesco que até aquele momento não era bem um país, mas uma vastidão de terra dividida entre uns poucos proprietários que se distinguiam em partes iguais pela ganância e pela indiferença às condições de vida das multidões que trabalhavam para eles, pouco lhes importando que estudassem ou deixassem de estudar, que tivessem casas com redes de esgoto ou cagassem no mato, que vivessem ou morressem – no caso dos pretos, que teimavam em se reproduzir feito ratos no esgoto, os donos da terra achavam melhor que morressem mesmo, o que certamente fariam se tivessem um mínimo de autorrespeito. (p. 59)

(...) a dívida do nosso futebol é pelo menos tão grande com o gongorismo dos narradores também. (...) Sem a nossa vocação doentia para a metáfora bombástica, o papo furado, o causo inverossímil, a gente não teria chegado tão longe. Mais de noventa por cento do público só tinha acesso ao futebol pelo rádio, e no rádio qualquer pelada chinfrim disputada em câmera lenta por perebas com barriga d’água ficava cheia de som e fúria. A cada cinco minutos os narradores faziam um Zé-mané qualquer aprontar feito de deus do Olimpo. Claro que esse descompasso entre palavras e coisas era inviável a longo prazo, não tinha como se sustentar. E como obrigar a narração radiofônica a ficar sóbria estava fora de questão, restava reformar a realidade. Foi assim que o futebol brasileiro virou o que é: em grande parte por causa do esforço sobre-humano que os jogadores tiveram que fazer para ficar à altura das mentiras que os radialistas contavam”(p.61)

“a diferença entre vitória e derrota sempre teve muito de fortuito no futebol, isso explica as crendices no oculto (...) a medida de caos que nunca deixa de reinar em campo mesmo quando os times são talentosos e organizados (...) só que era tudo besteira, ou se não besteira, vá lá, mitologia, linguagem. Como um radialista chamando de proeza um lance banal: linguagem pura. O sobrenatural era um véu que o pessoal aplicava sobre a realidade, não a própria realidade” (p. 166)

Não haveria aí a possibilidade de construir uma ponte entre a partida de futebol e a realidade brasileira, e o radialista com o intérprete? Ou não será o próprio Murilo Filho filhote desgarrado de Sérgio Buarque de Hollanda e outros colegas de trabalho? Na verve típica da literatura moderna, de valorizar a ambiguidade, e de escapar da pecha de romance-tese, em que todo o drama e personagens narrados viram roupagens pouco-convincentes para disfarçar uma Ideia Principal, a própria noção de ser possível “resolver” o país é ridicularizada pelo protagonista, o Murilo Neto:

“Acho que no fundo Murilo não se conforma de morrer sem ter entendido alguma coisa profunda sobre o Brasil, uma maluquice assim (...) Não entende ou não quer entender que já era, estilhaçou tudo, fodeu tudo. Não tem mais Brasil, se é que um dia teve. Não tem um país só.” (146)

Os contrastes entre os dois personagens são totais, não apenas nas opiniões, no interesse pelo futebol ou na disposição anímica em geral (enérgica no caso do pai, neurótica no caso do filho): se o pai valoriza a questão auditiva dos rádios, a maioria das referências do filho (reiteradas ad nauseam pela narrativa, parecendo quase impossível que algum minuto da cabeça do personagem não passe por algum objeto protegido por copyright) são de natureza audiovisual, do qual não há tanto refúgio de imaginação; se o pai se pretende escritor até o fim e ocasionalmente colore seu discurso com citações literárias, o filho é revisor de livro de auto-ajuda traduzido com control+v do Google. Até mesmo o comportamento sexualmente predatório dos dois se dá de maneira distinta, pautado pelo orgulho no caso do pai, em coleções públicas que parecem não ter fim, e vergonha, de prováveis apagamentos de números da agenda do celular, no caso do filho.

O próprio romance desenha essa substituição de visões de mundo, ou até mesmo de mundos, no capítulo em que discute a diferença entre o revival e a história, a Cultura De Verdade e o Pop, que seria o ponto fraco estético do livro (pelo excesso do modo explicativo) se as ideias ali fossem batidas ou minimamente conclusivas. A provocação não é pequena. Existe a constatação de que de fato foi destruída a visão histórica e de Grandes Interpretações da realidade, por ser insustentável qualquer construção retórica diante de tanta realidade circundante, o inchaço urbano em que a violência monstruosa é normalizada, a hipocrisias expostas em menos de vinte e quatro horas e que mesmo assim perduram, o fato de ser cada vez mais patente a impossibilidade de se sonhar com um mundo que não seja apenas ligeiramente melhor (e que mesmo assim melhore esse muito pouco a muito custo); por outro lado, o que veio para substituir esse otimismo infundado ou insustentável dos Projetos Nacionais tampouco satisfaz em qualquer critério que não o de distração imediatista. Decide-se que uma postura é insatisfatória utilizando certos critérios (a ineficácia, ou pelo menos a ineficiência) e a nova postura está menos apta ainda a lidar com o mundo se mantivermos os critérios que utilizamos ao descartarmos a anterior. Descarta-se a postura e, juntamente, os critérios que operaram o descarte. E o que resta?

O livro narra essa sucessão de posturas em ambiguidade esgarçada: é inegável o tanto de farsa que há na figura de Murilo Filho, capaz de opiniões como “poucos proprietários que se distinguiam em partes iguais pela ganância e pela indiferença às condições de vida das multidões” sendo ao mesmo tempo sendo colaboracionista da ditadura (no mínimo pela edição estatal de livros seus), e que, por tanto acúmulo histórico brasileiro de textos e discussões acaloradas e às vezes até sofisticadas, pouco parece ter sido feito para melhorar de fato a situação do país, qual seja o lado que se queira ver uma sociedade ideal (mais “livre” ou mais “igualitária”). Parece que tudo é mesmo uma merda.

No entanto, vemos junto com a reconstituição de diferentes épocas históricas do Brasil (dos anos 50 do interior do país, aos movimentados anos 60 e 70 do Rio de Janeiro, aos desencantos da redemocratização e os aparentes escombros de civilização atuais) a reconstituição também dos estilos literários que carregaram diversas épocas do país: temos crônicas esportivas, ironias machadianas entre outras mais brutas, brutalismos de Rubem Fonseca, folclores pitorescos à la Jorge Amado, algum pouco de regionalismo pacato de narrativa interiorana, letras de sucessos radiofônicos anos 80 dos primórdios do Pop brasileiro, até mesmo pedaço de soneto Belle Epocque e uma bizarra mulher que fala que nem o sobrinho do Iauaretê. Há um carinho inegável subjacente na riqueza de formas brasileiras no livro, em contraste imenso com o conteúdo que destila denúncias de violência, estupidez e preconceito por todos os cantos, como que em resposta esteticamente formulada à pergunta “mas por que afinal você ainda atura morar aqui”: “ah, não sei, um jeito diferente nas pessoas, não sei explicar direto”.

São várias as outras sacadas geniais do livro: o fato de uma narrativa ter como Figura Paterna Opressora um personagem de sobrenome Filho (e o filho oprimido na verdade ser Neto), com pouquíssimas referências a quem seria o patriarca original, mostrando que a imensidão da sombra paterna é algo superável, apenas não superado por Neto, tornando apenas mais terrível seu tormento. O fato da trama inteira de vingança se ordenar perfeitamente pelas lacunas sentimentais do filho, que compra os croquetes na previsibilidade de quem busca a estabilidade de uma rotina (em sua mente dando a grandiosa descrição de “ritual”), e de suas idas à casa do pai continuarem apesar de não dar qualquer aparência de resolução emocional vindoura, como o ressentido que revisita suas mágoas apenas para avivá-las, feito viciado que sabe que faz errado, só para um revival. O delineamento detalhado de um machismo venenoso disseminado como normalidade, acessível e operável tanto por Fodões quanto por Fodidos.

Até mesmo o que eu tinha achado que era defeito, certo excesso de foreshadowing do livro, tornando o suposto final surpresa um pouco previsível, na releitura se mostra fascinante: praticamente a cada quarenta páginas se vê um aviso de que as coisas não são como o protagonista as entende, o médico falando que Neto não se parece com o pai, sendo anunciado que o livro favorito é Dom Casmurro... a coisa primeiro parece quase livro de detetive que subestima a inteligência do leitor. Só que na segunda viagem percebe-se que os avisos não são a cada quarenta páginas, e sim a cada vinte, e não estão ali a serviço da perspicácia do leitor, e sim para evidenciar de novo e de novo a cegueira monstruosa de Neto, incapaz de enxergar o que é colocado de novo e de novo diante de si. O contraste que se impõe fortemente é a de seu pai biológico, que tinha o dom de ver um segundo adiante, e seu filho sem talento para o futebol e, mais para frente, para a vida como um todo. O que era tão promissor se torna frustrado para além das expectativas anteriormente delineadas, quebrado de uma forma antes inimaginável.

Foi esse, principalmente, o segredo de Rodrigues para conseguir abordar a questão nacional pelo futebol, não só fugindo como destruindo a armadilha do deslumbre; tratar o que É na sombra permanente e deprimente de O Que Poderia Ter Sido, que qualquer coisa de valor e relevância que apareça nesse país precisa vencer uma luta inglória para continuar existindo ou não ser cooptada e desvirtuada. Que a adolescência moral e intelectual perpétua do Brasil explicita a perda da inocência da infância e a frustração repetida de estar sempre aquém de um desenvolvimento e amadurecimento que nunca chega, e o abandono das expectativas de um país significativamente melhor não produz o apagamento das frustrações. Não vamos deixar de amargurar todas a canalhices de nosso mundo se aceitarmos elas como naturais; elas só vão deixar de melhorar na lentidão enlouquecedora como vem melhorando.

Pois elas podem começar a piorar. Como Neto percebe ao final de sua história, e como pudemos presenciar entre o setembro de 2013 da publicação do livro e esse 2015 que parece que não acaba, as coisas sempre podem piorar.

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